sábado, 19 de março de 2011

Portugal, S. A.

Ou o Processo Contra-Revolucionário em Curso!


Na 2ª semana de Março é anunciado o aparecimento dum livro, considerado como “um guião para o poder” do PSD, “encomendado” por Passos Coelho (que, segundo a notícia, também participou na sua elaboração) a Pedro Reis, tido como conselheiro económico do PSD, e, da pessoa do seu líder.

Somos informados dos participantes na sua elaboração; 55 dos mais poderosos empresários e gestores de Portugal, coordenados por Pedro Reis – ele próprio, também, gestor de empresas. O que pelas minhas contas, totaliza 56 “dos mais poderosos empresários e gestores de Portugal”, além de Passos Coelho, claro.

Uma “guião” que se afigura, todo ele, 1 programa de classe, 1 projecto de casta...
Uma lista (parcial) dos participantes, segue-se:

A saber:

Pedro Reis (gestor de empresas)
Américo Amorim (GALP)
Paulo Azevedo (Sonae)
Faria de Oliveira (CGD)
Carlos Santos Ferreira (BCP)
António Horta Hosório (Lloyds Bank)
Alberto da Ponte (Central de Cervejas)
Bernardo Bairrão (Media Capital)
Francisco Balsemão (Impresa)
José Maria Ricciardi (BES)
Luís Portela (BIAL)
Nuno Amado (Santander Totta)
Paulo Pereira da Silva (Renova)
Vera Pires Coelho (Edifer)
Vasco de Mello (Grupo José Mello),
etc.


1 - Numa apreciação imediata, é forçoso constatar, que, apenas os representantes de menos de 1% da população foram chamados a participar em tão ilustre documento.
O que permite concluir que mais de 99% (e seus representantes) não teve qualquer participação.
(Como curiosidade – assinalaria que só na lista acima, constam vários nomes que estão entre os 10 mais ricos do país).

Não deve pois causar espanto, concluir, que as perspectivas, as preocupações e os anseios, da quase totalidade da população, se encontrem ausentes e arredados de tão excelso documento.

Por exemplo;

Lembraram-se de pedir opiniões aos professores e alunos (e às suas organizações), embora falem de educação?

Ocorreu-lhes auscultar médicos e enfermeiros (e suas organizações), embora proponham sobre saúde (e já agora aos utentes)?

Acharam necessário ouvir juízes e demais agentes judiciais (assim como às suas organizações), apesar de julgarem sobre justiça?

Surgiu-lhes pertinente ouvir trabalhadores e os seus representantes, (já agora aos trabalhadores precários), embora façam propostas nesta área (que vão no seguimento das do actual governo mais PSD) – e cujo “guião” defende o reforço e o aumento da flexibilidade - ,e, na área da segurança social (defendendo a sua descapitalização)?

Já agora ocorreu-lhes importante, saber a opinão de pensionistas e desempregados (em particular daqueles que não recebem qualquer subsídio ou apoio social – devido aos cortes orçamentais sociais promovidos pelo governo, e, pelo partido promotor do documento em consideração)?

- Algumas constatações surgem de imediato:

- A expressão entrega a “gestores profissionais”, surge de alto a baixo;

.entregar as Universidades a “gestores profissionais” (retirando o Estado da gestão directa …)

.entregar a gestão operacional dos hospitais a “gestores profissionais” (introduzir mais gestão privada, privatizar unidades de saúde, …),

.entregar os tribunais a “gestores profissionais”,


- Em resumo, é portanto, forçoso concluir que se trata duma visão duma minoria social e económica, de toda uma sociedade – por definição múltipla e complexa. A visão dos empresários e gestores nacionais (a que o PSD se associa).

- Defende-se o princípio de aplicar ao país a lógica de funcionamento das empresas.

- O país visto como uma gigantesca empresa, e, gerido como tal.

- Uma espécie de República dos empresários e gestores, e, dos seus representantes no Parlamento.

- Estamos perante a mundividência dos empresários. - Trata-se, adiantaria, de uma visão penosa e tragicamente redutora;


2 – Defendem a, continuação, e, o aumento das privatizações. Como poderia Américo Amorim (assim como os outros empresários), defender (defenderem) outra coisa – se com a privatização da GALP, se tormou o homem mais rico do país. Riqueza, que se reforçou em 2010; (segundo o C. da Manhã de 22/01/2011; “A subida das acções da GALP representou um encaixe de 242 Milhões de € [só] em 2010 [para A. Amorim]) ...

- Que a actividade predatória seja levada ao extremo – é o seu programa!

- Privatizar tudo – defendem.

Transferir recursos e bens, públicos, e comuns – que deveriam promover o bem estar e a qualidade de vida da maioria - para um pequeno grupo. Aumentando a sua riqueza e o seu poder económico.

- O seu objectivo, é, o assalto ao que resta de bens e recursos públicos.

Torna-se óbvio, caso restassem dúvidas, a quem interesssa (e quem beneficia com), o programa político neo-liberal.

E as “golden shares”; são para desaparecer - claro – poder sem restrições aos empresários e gestores!

- Configura-se, uma contra-revolução em curso!

- Os empresários ao poder, já!

- Pretendo, neste momento, fazer uma rectificação ao anteriormente afirmado; que “pretendem privatizar tudo”; não é inteiramente verdade – sejamos justos – na proposta, não consta o BPN. Este deve ser mantido nacionalizado. Um gesto magnânimo, da parte dos empresários, que deve ser salientado. Magnanimidade, que se manteve, aliás por 2 vezes – o nº de tentativas em que o estado o tentou (re)privatizar.

- Cabe utilizar aqui a expressão; “Privatizar lucros e nacionalizar (ou socializar) prejuízos” - é esta a sua lógica.

- Hipócritas!, diria eu …

O banco levado à falência por digníssimos empresários – cujos nomes, só, não figuram, na, também,
ilustre lista (elevando-a para 57 ou 58) – porque estão a problemas com a justiça!

- Já agora fica uma sugestão; que o PSD, proponha no seu projecto de revisão constitucional, a alteração da designação do país, para: Portugal. S. A.. - isso sim, seria ousadia! ...


3 – Algo verdadeiramente significativo surge quando se fala no “sistema político” - onde é proposta a redução do nº de deputados para; 150 a 180 – isto é; uma redução de 50 a 80 deputados. O que a ser aprovado e aplicado;

Implicaria que muitos concelhos e freguesias, deixassem (ou praticamente deixassem), de ter representantes.

E implicaria também, que, os 3 menores partidos, deixariam de ter representação parlamentar, ou, passariam a ter uma representação residual – logo sem qualquer possibilidade de influenciar politicas, nem de exercer qualquer fiscalização.

- Isto é; que cerca de 30% das opiniões políticas dos eleitores, do país, deixaria de ter representação no parlamento.

Portanto, passaríamos a ter um parlamento onde, praticamente, só estariam representados PS e PSD.

- A concretizar-se tal proposta, estaríamos perante uma espécie de golpe palaciano institucional dos dois maiores partidos.

- O que, creio, representaria o maior golpe contra a democracia representiva (ou a democracia ela mesma), depois do 25 de Abril.

- De facto, quando se fala da redução do nº de deputados – fala-se da concentração de toda a representação (ou quase) e de todo o poder, legislativo e executivo, em apena dois partidos.

- Os partidos que governam o país à mais de 35 anos, e, que são, por isso mesmo, os únicos responsáveis pela situação de desastre em que nos encontramos, veriam o seu poder ainda mais reforçado – seria o seu domínio político (e não só) absoluto do país. E a continuação da espiral de degradação, económica e social.

Pretende-se, a manutenção do poder e dos interesses instalados, eliminando todos os possíveis obstáculos. Numa altura em que a esquerda obtém cerca de 20% dos votos e 31 lugares no parlamento. Sim, creio, que é este o “problema” que é preciso eliminar, e, que os empresários e o PSD tomam como um empecilho. A quê? Ao poder, aos cargos distribuídos pelos 2 principais (maiores) partidos (principescamente pagos) e aos negócios.

As PPP's e as rendas a 1 punhado de empresários – que proliferaram como cogumelos – em negócios ruinosos para todos nós, têm que se manter e proliferar a todo o custo.
Para tal ser conseguido, é necessário eliminar toda a possibilidade de alternativa política e de fiscalização no parlamento. - O reforço de um regime, onde a sobreposição entre política e negócios, tenda a ser total. Onde se esbatam, completamente, as diferenças entre poder político e poder económico.

Sim, é de poder, de cargos políticos (cujos vencimentos PS e PSD se recusaram a limitar) e de negócios, que se fala, quando se fala da redução do nº de deputados.

(O argumento da redução de despesas, por quem se opôs ao limite dos vencimentos dos gestores públicos – nem justifica comentário).

- Tal redução implicaria um empobrecimento da democracia – afastando pontos de vista problemáticos.O assalto ao poder, e, os negócios, têm que ser garantidos – sem vozes desfavoráveis, nem votos contra.

- Para tal, é preciso eliminar todo o “grão de areia”, da engrenagem da máquina de assalto.

Uma redução das possibilidades de escolha – das alternativas possíveis.

O que implicaria, um ambiente (político), fechado e claustrofóbico (ainda mais propício à estagnação do ambiente político) – numa espécie de “ditadura soft”. O que diferencia, politicamente, um regime parlamentar bipartidário, do regime de partido único (uma vez que as visões da sociedade, as práticas e os interesses (assim como a partilha dos cargos), são praticamente coincidentes) – muito pouco, creio.

- Toma-se a alternativa e o diferente, não como um bem em si, mas como 1 problema – especialmente, quando pode ter representação parlamentar e influenciar o espaço público.

- Se a tudo isto juntarmos os executivos camarários monocolores (com todos os pelouros atribuídos a 1 só partido - o vencedor, como também é proposto) – Imagina-se com facilidade, 1 país, 1 regime, monocórdico, monocromático/dicromático – de onde a pluralidade e a diversidade, não só não são preservadas como um bem; mas sim, vistas como 1 obstáculo – tal, é uma das visões, tragicamente empobrecedoras da sociedade, que subjaz a tal documento!

- Pretende-se eliminar a imprevisibilidade e a hipótese, do novo, e, da mudança (numa, espécie de, tentativa de congelar a história).

- Pretende-se, um totalitarismo claustrofóbico.

- Pretendem-nos fechar os horizontes.

- Querem que tenhamos, ao deitar e ao acordar – sempre o mesmo monótono horizonte projectado nas paredes.

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